Íntegra do parágrafo
1. Obrigação de investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis
3. Garantias de não repetição
i. Educação em direitos humanos nas Forças Armadas
DOS PONTOS RESOLUTIVOS –
Este blog tem por objetivo compartilhar notícias, reflexões e preocupações que relacionem as disciplinas de Direito Constitucional e Direito Internacional, em coerência com o pacifismo jurídico e, consequentemente, com os direitos humanos.
Direito e Literatura - O prisioneiro from Unisinos on Vimeo.
“Posto que as pessoas, dentro de seus próprios limites, seguem regras coletivas, tais como costumes e direitos, vê-se então despontar uma vontade de que também se estabeleçam relações transnacionais sob uma forma jurídica. Atribui-se a uma vontade jurídica desse tipo, internacional e transnacional, atravessando, pois, os limites impostos por fronteiras, o surgimento dos primeiros impulsos e dos trabalhos pioneiros na área de um Direito supranacional. Desde o início, houve duas áreas de atuação nesse campo jurídico: um Direito Internacional Público, ou Direito das Gentes, que cuida das relações interestatais, e um Direito Internacional Privado, mais tarde, Direito Cosmopolítico, que regula as relações intersociais, ou seja, o comércio, o casamento entre cidadãos de países diferentes e o intercâmbio científico e cultural” (HÖFFE, 2005, p. 16).
O objetivo do presente texto é apresentar alguns comentários à obra “Democracia no Mundo de Hoje” de Otfried Höffe. Nascido em 1943, Höffe é professor catedrático da Universidade de Tübingen, e atualmente é um dos maiores estudiosos da obra de Immanuel Kant (1724-1804) – tendo publicado obra homônima em 1995, e com reconhecimento também no Direito a partir da publicação de “Justiça Política” (Politische Gerechtigkeit, 1987) – onde evidencia a inseparável relação da Política com a Justiça e o Direito, entre outras.
Em “A Democracia no Mundo de Hoje” (Democratie im Zeitalter der Globalisierung, 1999), publicado no Brasil em 2005 pela editora Martins Fontes, o autor alemão apresenta uma proposta de República Mundial complementar em relação aos Estados, por isso edificada a partir de dois princípios da organização política estruturantes, subsidiariedade e federalismo, cujo objetivo é garantir uma ordem jurídica global de justiça.
A tese parte do seguinte pressuposto: a necessidade de ação que não se atém a fronteiras entre os Estados. Quando a necessidade de ação se torna global, toma forma a idéia de um Estado igualmente global, uma ordem jurídica e estatal de natureza internacional que, graças à auto-organização enfática, se estabelece como democracia global, como República Mundial” (2005, p. 1), de modo que as soluções de problemas globais não fiquem entregues apenas “à forças de mercado (neoliberalismo) nem a uma evolução meramente contingente (teoria sistêmica), e muito menos a uma combinação dessas duas componentes” (ibid., p. 2).
A primeira parte do texto descerra os Desafios da Época, iniciando com a globalização complexa - “a globalização como crescimento e consolidação das relações sociais internacionais” (p. 6), num ambiente de novos atores e novos desafios que transcendem os limites estatais, exigindo nova forma de ato político que venha complementar o Estado, não substituí-lo. Höffe aponta o destino comum da humanidade em três dimensões: 1. Uma comunidade de violência multifacetada que usa o poder em detrimento do Direito num desserviço ao bem-estar humano (armamentismo, terrorismo, guerras, etc.); 2. À serviço da vida e do bem-estar também existe uma comunidade de cooperação que envolve grupos de pressão globais em favor dos direitos humanos (tribunais com competência mundial, responsabilização internacional dos Estados por violação dos direitos humanos, liberalização da economia, opinião pública mundial, etc.); 3. Por força do ônus da economia transnacional como o desemprego, danos ambientais formando uma comunidade de miséria e sofrimento (fome, pobreza, subdesenvolvimento).
Daí o autor parte a uma conclusão ou visões para o futuro. A forma para responder aos desafios da globalização aponta para “um imperativo moral a supremacia do direito e da justiça sobre a violência” (2005, p. 20) – imperativo universal do Direito, do Estado e da Democracia. “Ainda será necessário averiguar cm exatidão em que áreas de atuação urge uma ação global e que princípios deverão norteá-la. Nos três grupos de fenômenos, porém, já se delineam três áreas: (1) no intuito de se abolir a comunidade de violência, é imperativo que se instaure uma ordem global de direito e paz; (2) a comunidade de cooperação global carece de uma esfera de ação imparcial pautada pela justiça, abrangendo desde medidas contrárias a distorções de concorrência por parte dos Estados até a garantia de critérios sociais e ecológicos mínimos; (3) por último, a fome e a miséria lançam questionamentos acerca de justiça social, mas também de solidariedade global e de filantropia global” (2005, p. 22), propondo-se a pensar um ‘ainda-não’ possível de ser alcançado numa ordem global de paz.
Höffe desenvolve uma proposição elaborada a partir dos referenciais kantianos, retomando a cada desdobramento de sua proposta as três principais obras de Kant para a formação de uma ordem cosmopolita (À Paz Perpétua, A Doutrina do Direito e Idéia de uma História Universal de um Ponto de vista Cosmopolita), assim como os as críticas apresentadas ao projeto kantiano.
Ao construir a proposta de uma República Mundial, Höffe analisa as principais objeções até então apresentadas por diversos autores aos projetos teóricos existentes até então, sustentando com base nos princípios da subsidiariedade e do federalismo um sistema adequado à edificação de uma ordem jurídica mundial. Ademais, sua proposta é assentada em princípios de justiça e de legitimação pela democratização do sistema jurídico.
Höffe também oferece uma visão profunda sobre a filosofia kantiana e sua perspectiva cosmopolita sobre o Direito e a Paz, além de conferir pressupostos ao direito justo, debater sobre o direito intercultural e demais constructos do pacifismo jurídico, conforme lista de referências abaixo. “nenhum Estado pode viver sua própria história sem ser influenciado por todos os outros” (2005, p. 17). Vale a pena conferir!
REFERÊNCIAS E SUGESTÕES PARA CONSULTA:
HÖFFE, Otfried. A
HÖFFE, Otfried. Immanuel Kant.
HÖFFE, Otfried. Kant's cosmopolitan theory on law and peace. Cambridge: Cambridge, 2006. 254p.
HÖFFE, Otfried.
HÖFFE, Otfried. Derecho intercultural. Barcelona: Gedisa, 2001. 288p.
Foto da Audiência Pública da Comissão de Relações Exteriores realizada na Câmara de Deputados em 4 de maio de 2010. Eugênio Sá da Avibrás, Major-Brigadeiro Marcelo Mario de H. Coutinho do Ministério da Defesa, Deputado Fernando Gabeira, Ministro Santiago I. Mourão do Ministério de Relações Exteriores e eu, Gustavo Vieira, representando a CMC/ICBL e Campanha Brasileira contra Minas Terrestres e Bombas Cluster.
Gustavo Oliveira Vieira
As novas demandas impostas pelo processo de mundialização têm exigido participação mais ativa no sistema internacional dos tomadores de decisão legitimados pelo processo democrático, ao mesmo tempo em que a pressão por democratizar o sistema internacional aumenta. Tudo isso tem demonstrado a necessidade da tomada de posição por parte dos parlamentares, representantes do Poder Legislativo legitimados por meio do voto direto dos cidadãos, em temas de política externa, além da criação de novas instancias políticas próprias para isso como o Parlamento Europeu e agora o Parlamento do MERCOSUL - PARLASUL.
É conhecida a atuação do Congresso Nacional para referendar a participação do Brasil a ato internacional – após o Poder Executivo assinar tratado internacional o Poder Legislativo precisa aprovar por meio de Decreto Legislativo -, e o STF tem problematizado também a necessidade do mesmo ato em caso de denúncia a tratado internacional pelo Brasil. Mas quando o Estado se omite em relação a certas questões no âmbito da política internacional, o que fazer?
A semana passada, 3-7 de maio de 2010 ofereceu-nos dois brilhantes exemplos sobre como isso pode ser feito. (1) 68 senadores dos Estados Unidos da América assinaram um ato requerendo à Administração Obama que se unam ao Tratado de Erradicação das Minas Terrestres de 1997 (que já conta com 156 Estados Partes) – são mais de 2/3 dos membros do Senado, ou seja, já tem apoio necessário para a eventual ratificação do ato internacional; (2) a Câmara dos Deputados da República Federativa do Brasil sediou uma Audiência Pública da Comissão de Relações Exteriores com o objetivo de debater a fabricação de Bombas Cluster por parte do nosso Estado – chamando os Ministérios da Defesa, Ministério de Relações Exteriores, sociedade civil e indústria bélica a manifestarem-se a respeito.
Esse último caso traz um exemplo útil. O Brasil não assinou a Convenção sobre Munições Cluster que estabelece a erradicação dessas armas. Qual opção tem o Congresso e seus membros para agirem? A opção encontrada pelo Deputado Federal Fernando Gabeira para alinhar o Brasil na referida política humanitária internacional foi a de propor um projeto de lei (PL 4.590/2009) estabelecendo termos do tratado internacional como lei interna e chamando audiência pública sobre o tema. Aliás, no âmbito das negociações da Convenção sobre Munições Cluster, também conhecida como Convenção de Oslo, os eventos diplomáticos eram acompanhados de reuniões de parlamentares de todo o mundo, firmando uma espécie de chamamento para que os parlamentos se posicionem sobre temas prementes da política internacional.
É preciso trazer ao debate público a tomada de posições do Estado sobre sua política externa, e o Congresso Nacional pode desempenhar um importante papel nesse sentido. A diplomacia parlamentar é um imperativo do estado da mundialização e da política internacional do século XXI e ambos os exemplos citados acima, nos EUA e no Brasil, demonstram como a diplomacia parlamentar pode agir em prol do povo representado e em prol da humanidade, simultaneamente.
Foto de Abdullah Yaqoob, vítima de bomba cluster - dos arquivos da DCA
A entrevista abaixo foi realizada pelo Instituto Humanitas em 09/2009 e publicada online e na Revista do Instituto Humanitas Unisinos, N. 306, Ano IX, São Leopoldo, 31.08.2009, ISSN 1981-8469, p. 52-55.
O conceito de segurança precisa ser revisto. É preciso focar “na segurança humana que conceba a soberania como a responsabilidade dos estados de protegerem os cidadãos, e não suas armas”
Por Patrícia Fachin
As bombas cluster também conhecidas como bombas cacho “podem funcionar como minas terrestres”, escreve Gustavo Oliveira Vieira, em entrevista concedida, por e-mail, à IHU On-Line. Isso porque, elas se abrem e se espalham antes de tocar o solo, difundindo o impacto das explosões. Ao se abrirem no ar, explica, “projetam dezenas ou centenas de submunições que passam a funcionar ao modo de granadas, que por sua vez deverão explodir ao tocaram o solo”. Contrário à fabricação das bombas cluster, o professor frisa que as taxas de falha são altíssimas. Como exemplo, cita os quatro milhões de submunições jogadas por Israel no sul do Líbano, em 2006. Segundo ele, estimativas mostram que aproximadamente um milhão falhou.
O Brasil é produtor, armazenador e exportador dessas armas e essa é uma das justificativas para que o país não apoie negociações internacionais de combate a esse modelo de armamento. Na opinião de Vieira, o impedimento brasileiro está relacionado ao comércio internacional. “Foi liberada, ano passado, uma exportação dessas armas com mais de meio bilhão de reais”, informa. Segundo o pesquisador, “a delegação brasileira inclusive no ano passado chamou um diretor da indústria fabricante destas armas para a negociação da Convenção sobre Certas Armas Convencionais CCAC – dando mais um indício que a preocupação primordial pode ser comercial e econômica”.
Para ele, iniciativas como essa representam uma afronta aos princípios constitucionais que devem guiar a política externa brasileira. “A Constituição brasileira no seu artigo 4º estabelece como princípios a defesa da paz, a prevalência dos direitos humanos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Esses princípios não são opcionais, possíveis de aderir por conveniência, eles deveriam vincular cada uma das decisões do Brasil nas relações internacionais”, complementa.
Gustavo Oliveira Vieira é graduado e mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Além de docente na Unisinos, atualmente, também é professor do Centro Universitário Franciscano – Unifra. Dedicado a estudos relacionados ao Direito Internacional dos Direitos Humanos, Vieira apresentará a palestra Paz por meio do Direito Internacional: a Convenção de Oslo sobre bombas cluster e a (crítica) posição brasileira, na quarta-feira, 02-09-2009, das 9h às 11h, no Auditório Maurício Berni, na Unisinos.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Quais são as características e os perigos causados pelas bombas cluster? Elas podem ser comparadas a minas terrestres?
Gustavo Oliveira Vieira - As bombas cluster – também chamadas de submunições cluster, bombas cacho ou de fragmentação – são artefatos bélicos jogados do ar ou do solo por meio de um contêiner, e, ao se abrirem no ar, projetam dezenas ou centenas de submunições que passam a funcionar ao modo de granadas, que por sua vez deverão explodir ao tocarem o solo ou o alvo. O problema é que as taxas de falha são altíssimas (das quatro milhões de submunições jogadas por Israel no sul do Líbano em 2006, estima-se que um milhão falhou), a imprecisão é grande (varia conforme o tipo de solo, inclinação, vento, pressão, manutenção do artefato, etc.) e o poder explosivo é muito grande, muitas com potencial para penetrar blindados.
Dessa forma, podem funcionar como minas terrestres, gerando um efeito indiscriminado, durante e após os conflitos, e acionadas pela própria vítima.... O problema é que os Estados armazenam bilhões destas submunições, e não havia, até a Convenção de Oslo, aberta para assinaturas em dezembro último, um instrumento legal vinculante que regulasse este armamento.
Gustavo Oliveira Vieira - O Brasil é produtor, armazenador e exportador deste tipo de arma. Parece extremamente lógico que os militares não queiram abrir mão de nenhuma arma que possa ter utilidade militar, ainda que marginal. Mas a decisão é do Itamaraty. E a justificativa variou.
Primeiro o MRE questionou a legitimidade do processo de Oslo de negociação, que o único fórum correto seria aquele da Convenção sobre Certas Armas Convencionais (CCAC). No entanto, isso jamais impediu o Brasil de ser parte de tratados internacionais. Tanto as Convenções de Genebra que o Brasil promove como o Tratado de Ottawa sobre erradicação das minas terrestres foram negociados fora da ONU. Mas tem todo apoio da ONU, do próprio Secretário-Geral, das suas agências, enfim, e depois de fechados retornam à ONU para operacionalização. Ora, as negociações no âmbito da CCAC só ocorrem por consenso – e consenso com os Estados membros da CCAC não tem condições de enfrentar problemas humanitários. Se um se opõe, não sai, ou fragiliza o texto – foi o que ocorreu com o tema das minas. Ademais, é bem menos universal, pelo número de Estados Partes que a Convenção de Ottawa, por exemplo, que conta hoje com 156 Estados, enquanto a CCAC não chegou a 100.
Depois do texto do tratado de Oslo, concluído nas negociações, o MRE o rechaçou por considerar o tratado de Oslo discriminatório, pois não considera bomba cluster quando combina sistemas de segurança e precisão do tipo guiadas por sensores, autodestruição eletrônico, autodesativação,com menos de dez submunições e mais de 4 quilos cada submunição. Nós, como campanha internacional pela erradicação bombas clusters (CMC), como sociedade civil organizada participando do processo, buscamos um tratado sem qualquer exceção – que erradicasse todas. O Brasil não quis participar das negociações. De toda forma, realmente essa exceção exige mecanismos importantes para amenizar o problema humanitário e banir todas as submunições clusters até hoje utilizados.
O que não é dito pelo Itamaraty é a questão do comércio internacional. Foi liberada, ano passado, uma exportação dessas armas com mais de 500 milhões de dólares. Talvez a causa maior. O que aponta à direção de um pragmatismo amoral da política externa brasileira.
A meu ver, isso representa uma afronta aos princípios constitucionais que devem guiar a política exterior do Brasil. A Constituição brasileira no seu artigo 4º estabelece como princípios a defesa da paz, a prevalência dos direitos humanos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Esses princípios não são opcionais, possíveis de aderir por conveniência, eles deveriam vincular cada uma das decisões do Brasil nas relações internacionais.
IHU On-Line - Os militares brasileiros alegam que não utilizam essas bombas. O que justifica, então, tanta resistência em banir a fabricação desses armamentos?
Gustavo Oliveira Vieira - Os militares brasileiros não vão à guerra para defender o Brasil há mais de 60 anos. Por isso também não usam essas armas. E está certo, faz parte da nova lógica internacional de cooperação, militares preparados para apoiar a construção da soberania na Amazônia, missões de paz, crises internas, enfim. Ainda assim, na lógica militar não faz sentido abrir mão de qualquer arma. Mas quem decide não pode utilizar uma lógica militar, mas olhar o todo. Decidir isso é considerar que todos podem agir também dessa maneira. E como líder mundial, o Brasil oferece um exemplo que puxa outros países consigo. É uma questão de política interna, voltada para o mundo. Será uma política belicosa ou pacifista?
Consenso absoluto é infelizmente impossível. Veja o caso das minas terrestres antipessoal. Dezenas de milhões de minas plantadas planeta. Também são armas de pobres, como se diz, matando pessoas mais pobres ainda em quase cem países. E alguma utilidade militar as minas teriam. Agora, a produção, caiu de 50 países na década de 90 para menos de dez, dois países apenas usaram no último ano – sendo que chegaram há muitas dezenas. Mas quem mais tem utilizado são as guerrilhas – os atores armados não-estatais. O trabalho está dando muito resultado. Dezenas de milhões foram destruídas para implementação do Tratado de Ottawa – veja o sentido preventivo, parou a produção, destruíram estoques...o futuro está sendo preservado, e isso é difícil de contabilizar.
Se o consenso é impossível, um passo a frente de cada vez é, sem dúvida, necessário.
IHU On-Line - O Brasil tem uma forte campanha contra o desarmamento e, ao mesmo tempo, se opõem ao banimento das bombas cluster. Isso é uma contradição?
Gustavo Oliveira Vieira - A meu ver sim. O Brasil, e o MRE, tem posições exemplares em muitos aspectos. Veja o caso do desarmamento nuclear. O Brasil, a partir da embaixada para desarmamento em Genebra, com o Embaixador Soares e o Conselheiro Julio Laranjeira, está tentando um programa de ação para o desarme nuclear. Algo fundamental para a própria espécie humana. No campo dos direitos humanos o Brasil é parte da grande maioria de instrumentos internacionais, tendo se submetido à Corte Interamericana de Direitos Humanos (coerente com o que diz a Constituição e inclusive o artigo 7º da ADCT que indicava que o Brasil propugnaria por um tribunal internacional de direitos humanos). Falta esse passo agora, das bombas cluster.
Ainda assim, o Brasil tem positivamente tentando negociar um protocolo no âmbito da CCAC para regular bombas cluster. Isso não resolverá o problema humanitário, e por isso não é suficiente, mas é muito mais do que nada. Será um passo positivo, se sair.
Gustavo Oliveira Vieira - O deputado Fernando Gabeira é uma voz lúcida, mas, infelizmente, minoritária no Congresso Nacional. Há milhares de projetos de lei. A proposta dele tem muito a ver com a necessidade de se pautar o tema no Congresso. É preciso que se debata o tema, se leve à esfera pública.
Sobre o armamentismo, cada região e cada país têm um contexto interno e internacional muito peculiar. No caso do Brasil, o aumento do orçamento militar tem, em grande parte, a ver com o sucateamento dos instrumentos e salários. É preciso meios, mas no século XXI penso que conhecimento é tão ou mais importante para se garantir soberania quanto as armas. Um exemplo é o caso da Amazônia. É óbvio que nosso conhecimento e, consequentemente, soberania sobre a Amazônia é ainda precário. Culpa da falta de armas? Não, certamente que não, mas da política interna e da falta de conhecimento que temos da região, das espécies e até das pessoas que moram lá.
A concepção de soberania para o século XXI mudou. Não pode mais ser a westfaliana do século XVII. Será que as armas não têm hoje uma importância mais econômica que de segurança, efetivamente? Senão, quais seriam os inimigos do Brasil?
O próprio conceito de segurança precisa ser revisitado. Da segurança nacional, de meados do século XX, é preciso se focar hoje na segurança humana que conceba a soberania como a responsabilidade dos estados de protegerem os cidadãos, e não suas armas.
IHU On-Line - Como construir a paz por meio do Direito Internacional? Isso é possível, considerando que os países apresentam interesses diferentes?
Gustavo Oliveira Vieira - As coletividades sempre terão que apontar interesses diferentes. Isso é fundamental para uma construção democrática. Ainda que a democracia no sistema internacional seja um dos seus grandes défits.
Por outro lado, a construção da paz por meio do direito e por meio do direito internacional é uma resposta que muitos autores renomados se debruçam (Kelsen, Bobbio, Höffe, Habermas, entre muitos outros). Sabemos como não é. E certamente não é pensando apenas nas questões internas. Os estados precisam passar a definir suas políticas internas e internacionais tendo como referência a construção de uma sociedade mundial.