domingo, 22 de novembro de 2009

A VOCACÃO PATRIMONIALISTA E (DES)FUNCIONAL DO TCE



As polêmicas que tem mantido o Tribunal de Contas do Estado do RS persistentemente na mídia estão ligadas, em grande parte, à crise política que a República Federativa do Brasil passa. O descrédito sobre a classe política chegou ao seu ápice. Exemplo claro foi o resultado da enquete realizada pelo programa Conversas Cruzadas da TVCom, da última segunda-feira (16/11/2009), do qual participei, mais de 90% dos telespectadores posicionaram-se pela exclusão total dos políticos na composição do TCE-RS, numa demonstração explícita da péssima expectativa do povo sobre os políticos.

Dois temas têm emergido do debate: 1. a manutenção dos supersalários de parte dos servidores do TCE, em evidente violação à Constituição, e, 2. a composição demasiado política do órgão que destina a maioria de suas cadeiras a deputados estaduais. Depois de uma vida destinada à política, o deputado deve julgar as contas de seus colegas, por vezes correligionários da mesma legenda, o que levanta a legítima suspeita se o funcionamento do TCE não seria vocacionado a sua própria desfuncionalidade.
A manutenção do supersalários demonstra clara lógica patrimonialista. A Constituição estabelece, em seu artigo 37, XI: “a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se, como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos”. Direito adquirido não pode ser usado para encobrir vantagens, que além de inconstitucionais, são pautadas por uma lógica patrimonialista do uso do poder. Ademais, a economia anual que o corte dos supersalários é estimada em mais de 9 milhões de reais ao ano, ou, dezoito mil salários mínimos (cfe p. 12, ZH, 29/04/09). A Constituição fala em direitos adquiridos. Seriam estes direitos adquiridos ou privilégios adquiridos? É um direito adquirido que o salário ultrapasse o teto estabelecido pela Constituição? Não estamos falando em cortar os salários integrais de ninguém, mas ajustá-los a um sistema republicano de teto máximo constitucionalmente fixado.

Outra decisão indispensável recai sobre a forma da composição do TCE. O órgão precisa reduzir significativamente o espaço dos deputados estaduais, para no máximo um quinto dos membros, abrindo mais vagas para pessoal de carreira do próprio tribunal, poder judiciário, ministério público, e, quem sabe, também da OAB, para alcançar uma equiparação adequada entre órgãos, técnicos, políticos e juristas, gerando, assim, um melhor nível de imunização à condução eminentemente política do TCE, e, portanto, ao controle do erário público dos gaúchos.

A possibilidade da superação da crise política que se reflete hoje no TCE está nas mãos do próprio tribunal e da Assembléia Legislativa. A opção aos deputados estaduais e ao novo presidente doTCE é, de um lado, manterem-se como co-autores, partícipes das causas da depreciação generalizada da classe política e da descrença pública irrestrita, ou, por outro lado, demonstrar, pela via das novas decisões – corte dos supersalários e reforma sobre a composição do órgão, soluções em prol da reconstituição da deturpada imagem que foi e está sendo ainda construída em desfavor dos políticos, e, sobretudo, demérito à própria cidadania.

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