quinta-feira, 30 de julho de 2015

CONSTITUCIONALISMO NA MUNDIALIZAÇÃO


              Gustavo Oliveira Vieira
Implicações Constitucionais da Mundialização
Quais são os impactos da mundialização sobre o constitucionalismo? Qual o modelo de Estado constitucional adequado em tempos de globalização? Qual é a direção, do ponto de vista jurídico-político, que se deve equacionar a abertura do Estado no cenário pós-nacional? Diante das ameaças hegemômicas e de dominação, quais são os referenciais que perpetuam o constitucionalismo como base para um projeto civilizatório pautado na emancipação social deste ambiente que transcende as cercanias estatais? Foram estas indagações que pautaram a pesquisa que resultou no livro “Constitucionalismo na Mundialização”.
A investigação parte da premissa de que os desafios contemporâneos do constitucionalismo vêm sendo redimensionados para abranger as dinâmicas próprias do cenário pós-nacional. Isso não significa que os reptos inaugurais do Estado constitucional, da emancipação do jurídico em relação ao campo político, tenham se esgotado, mas, concomitantemente, novas tarefas apresentam-se, como as questões socioambientais e democráticas, emaranhadas na diluição das fronteiras entre o doméstico e o exterior, o interno e o internacional. Tudo isso, amplamente catalisado pelos processos multidimensionais e ambíguos da mundialização.
A transnacionalização do capitalismo acompanhada das mudanças na produção e financeirização da economia, sob o aporte das novas tecnologias, instaura complexidades de mais profundo calado nas dinâmicas sociais, políticas e jurídicas. Engendra-se, com isso, uma situação de crises – tanto do Estado quanto da Constituição – e de transformações em que as respostas institucionais tecidas no Estado nacional constitucional demonstram claro esgotamento, sobretudo na medida em que já não se crê ou não se confia mais nas expectativas que originaram o seu modelo – e por isso a pertinência de se falar na transição paradigmática do Direito.
O fato de o arquétipo institucional forjado pelo Estado nacional estabelece demarcações espaciais para a organização política, jurídica e cultural da comunidade que passam a demonstrar uma certa exaustão. O novo cenário impõe uma revisão nos pressupostos do Estado Democrático de Direito, notadamente no que diz respeito às condições de legitimação das decisões políticas além das margens nacionais – originalmente blindados às deliberações do tipo democráticas.
Dito de outro modo, se o zeitgeist desenhado pela mundialização redimensiona espacial e temporalmente a faticidade contemporânea, acarretando uma verdadeira implosão dos pilares que amparam o Estado em seus pressupostos de legitimidade – na medida em que os procedimentos democráticos efetivamente não alcançam a composição de discussões, decisões e deliberações que se colocam além do Estado nacional – o mérito das decisões falham na sustentação democrática. Nesse contexto, o Estado tende a ser cada vez mais um co-decisor em espaços deliberativos extranacionais, cuja opção e pertinência sobre as tarefas para implementação doméstica colocam-se à margem da esfera pública democrática.  É em torno desse quadro que se esculpiu a questão que orienta a pesquisa.

Direitos Humanos, Sociedade Civil e Democracia no cenário pós-nacional
A relevância deste assunto emerge da faticidade de uma sociedade em processo de mundialização, em contraponto a um paradigma jurídico-constitucional forjado para um Estado do tipo nacional, que precisa dialogar com perspectivas teóricas interdisciplinares para tornar possível uma nova abordagem. Afinal, o sistema internacional dominado pela política do mercado demanda um maior equilíbrio que deve ser posto pelo Direito, com evidentes lacunas do ponto de vista da democracia, a ser composto pela maior participação da Sociedade Civil.
Tudo isso vem a estabelecer novos desafios ao Direito como ciência, revisitando a relação com a Moral (Paz) e a Política (internacional) a partir de proposições à teoria as fontes (internacionalização do Direito Constitucional e Constitucionalização do Direito Internacional) que concebam um olhar contemporâneo sobre a relação entre o Direito e a Democracia, compreendidos também sob novas transposições da geografia, ou melhor, o Direito e da Democracia sob impacto da desterritorialização (da sociedade, do mercado, da cultura e da política).
Nesse cenário, pertine compreender o fenômeno mundialização, sintetizado na formação de um cenário pós-nacinal que se desvela como zeitgeist contemporâneo, em sua complexidade e ambiguidade para, daí, revisar a dupla face do impacto produzido no constitucionalismo, que vai da internacionalização do direito constitucional à constitucionalização do direito internacional.
Segundo o prefácio de Bolzan de Morais, “[s]ó assim este trabalho se construiu, como um texto que procura reconstruir as circunstâncias que envolvem as transformações sofridas/experimentadas pelo cenário político-institucional contemporâneo, especialmente no campo dos direitos humanos e do constitucionalismo – e suas imbricações intrínsecas -, bem como projetar as possibilidades de as conquistas civilizatórias servirem como meios efetivos e eficazes para a construção de uma “alter”sociedade mundial demarcada pela “paz”, pelos “direitos humanos” e pela “democracia” em um processo de “vir-a-ser” aberto e inacabado, como Gustavo sustenta”.
Estrutura e Origem
O texto é desenvolvido em duas partes, cada parte com dois capítulos. A primeira parte trata da (I) “Formação do Cenário Pós-Nacional”, que aborda de início (1) “Uma leitura crítica da mundialização”, subdividida em três subcapítulos, e no segundo capítulo enfrentando o tema da (2) “Altermundialização”, inicialmente com a questão dos (2.1) “Direitos Humanos Universais” e em seguida aprofundando a questão da (2.2) “Sociedade Civil (Global)”. A segunda parte tem como título as (II) “Implicações Constitucionais da Mundialização”, cujo primeiro capítulo, terceiro do livro, aborda o (3) “Redimensionamento do Constitucionalismo”, de um lado enfrentando a (3.1) “Internacionalização do Direito Constitucional”, à luz dos autores Mirkine-Guetzévitch, Häberle, Maziau, Pernice, Teubner, Canotilho e Marcelo Neves, para, em seguida, enfrentar a questão da (3.2) “Constitucionalização do Direito Internacional”. Com isso, estão dadas as bases para o quarto e último capítulo: (4) “O Constitucionalismo pós-nacional”, que produz uma síntese das críticas e promove uma revisitação à teoria constitucional, propondo a busca por novas fontes de legitimidade, traduzidas com densidade teórica e proposições práticas. 
O livro “Constitucionalismo na Mundialização: desafios e perspectivas da democracia e dos direitos humanos”, publicado pela Editora da UNIJUÍ, ano 2015, 344p., é resultado da tese de doutoramento de Gustavo Oliveira Vieira, defendida em 2012 no Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS, com período sanduíche na University of Manitoba, Canadá, e orientada e prefaciada pelo professor Dr. José Luis Bolzan de Morais, cuja defesa contou com a presença dos professores José Luiz Quadros de Magalhães(PUC-MINAS/UFMG), Alfonso de Julios-Campuzano(USevilha), Paulo Márcio Cruz (UNIVALI) e Lenio Luiz Streck (UNISINOS), além do orientador. Entretanto, cabe salientar que a pesquisa de fato iniciou muito antes, no perído da iniciação científica em 1998, sob o título “A Constitucionalidade dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos”, e daí teve uma série de desdobramentos, cujo desfecho foi a tese.
Uma leitura estimulante, não apenas sob o aspecto técnico, mas também ético”. (Fábio Konder Comparato).

VIEIRA, Gustavo Oliveira. Constitucionalismo na Mundialização: desafios e perspectivas da Democracia e dos Direitos Humanos. Ijuí: Unijuí, 2015.